Coluna
Viagem na babagem

por Camila Aagesen

Viagem: a tal fonte da juventude

O tema dessa semana me pegou e me travou. Não conseguia escrever uma linha. Talvez por ter acabado de completar 40 anos e estar me entendendo com essa nova idade. Uma idade que eu sei que não sou velha, mas também não sou mais jovenzinha.

Me peguei pensando sobre as viagens que já fiz, as formas como já viajei, como me senti. No sentimento de “ainda tenho idade para ficar num albergue?” ou “será que sou muito jovem para fazer um cruzeiro de travessia, será que só vai ter a terceira idade?”

Lembro de me sentir uma senhora idosa quando com quase 30 anos viajava com meu marido, querendo performar o que uma mulher casada gostava, vestia, comia, que tipo de lugar frequentava, que tipo de perrengue “não tinha mais idade” pra aguentar. E lembro de estar mochilando sozinha, anos mais tarde, ficando em albergues com mais 5 pessoas no quarto, fazendo amizade em bares duvidosos com pessoas de 20 anos – e tendo que aprender a ser extrovertida e “jovem” novamente.

Li em algum lugar que viajar nos mantém jovem, pois a gente aprende coisas novas, faz conexões, descobre culturas. E talvez o negócio não seja tentar se manter jovem pra sempre, mas se manter curioso, aberto a novas experiências, continuar se surpreendendo com o mundo.

Acho que envelhecer, para além do biológico, é divertidíssimo, por que a gente passa a enxergar as coisas como elas são, e a maioria das coisas que a gente acha que são muito importantes, são irrelevantes.

Tudo fica mais leve.

Um adolescente acha tudo bobo, se falar pra ele viajar com a família, é chato, prefere ficar no celular do que ver as ruas comuns de uma cidade do interior ou ficar de fone do que ouvir o mar do caminho para a praia que realmente está indo.

Depois a gente cresce, começa a fazer as viagens com amigos ou em casal, e é uma cagação de regras que meu Deus. É divertido? Sim, tem que ser, ta no roteiro feito cuidadosamente numa planilha de Excel.

Depois a gente cresce mais e viaja com filhos (ou cachorros) e fica lembrando e comparando de quando viajava com os pais. Pensando como eles aguentavam aquele caos de crianças e viagens de carro, perrengue, sendo que você já não aguenta tanto com muito menos filhos e mais conforto.

Então a gente cresce mais e passa a entender o que é realmente importante. O que é realmente perrengue na vida, e como diz a minha mãe “vê os jovens sofrendo por cada bobagem” e passa a olhar o mundo com um olhar mais lúcido.

Eu fiz uma peregrinação a pouco tempo, onde eu andava uma média de 24 quilômetros por dia, dormia em albergues municipais, dividindo beliche com outros peregrinos.

Lembro que na minha primeira noite depois de andar o dia inteiro, eu estava EXAUSTA, num nível que não lembro de ter ficado na vida. Eu li antes de ir que eu deveria levar um saco de dormir caso fosse ficar em albergues municipais pois eles não davam roupas de cama.

Estava sentada na minha cama, arrumando minhas coisas quando chegaram quatro senhoras francesas de mais de 80 anos falando muito e rindo. Três delas iam ser minhas companheiras de beliche, uma em cima de mim, e as outras duas no beliche da minha frente.

A primeira coisa que eu fiz foi oferecer a minha cama, e eu ficaria na cama de cima, para a senhora não precisar subir. Ela agradeceu e disse que não precisava que ela estava ótima em ficar na cama de cima.

Outra me perguntou onde pegavam os sacos de dormir, eu expliquei que aquele era meu, que não sabia se tinham para emprestar ali.

Ela traduziu para o francês para as outras e ao invés da reação que eu estava esperando, elas começaram a rir. Rir muito. Foi maravilhoso.

Fizeram piadas sobre se enrolar nas toalhas de banho pra dormir, e assim fizeram, sem parar de fazer piadas até a hora de dormir.

Aquela leveza de “ta tudo bem” que vem com a maturidade foi exatamente o que eu estou tentando dizer aqui.

“ah mas quanto mais velhos, queremos mais conforto” e ok, pode ser, mas acho que até a página dois, pois quanto mais velhos podemos até querer mais conforto, porém ficamos mais flexíveis e tranquilos com o que está fora do nosso controle, e por consequência acabamos aproveitando muito mais.

O que acham?

Camila Aagesen é viajante profissional, se encontrou na escrita e comunicação, virou contadora de histórias, gosta mais de frio do que de calor, apesar de adorar (curtas) temporadas em ilhas quentes. Com a alma aventureira se desfez de sua base em São Paulo capital em 2018 para conhecer lugares e histórias. @camilanomade

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