Coluna
Universo feminino

por Priscilla Vogt

Sentir, amar, existir

Para falar de sentimentos pensando em nós, mulheres, eu poderia seguir por diversos caminhos e explorar inúmeras nuances desse tema. Mas escolhi abordar aquele que talvez seja a principal dor — e também o maior desafio — dos nossos tempos: a dificuldade em se sentir amada.

Em uma era de independência feminina, amores líquidos e frágeis, e uma busca constante por autossuficiência, vamos nos endurecendo. E, paradoxalmente, aumentamos ainda mais o buraco da necessidade de sermos amadas — sem perceber, acreditando que estamos indo bem.

Mergulhamos cada vez mais fundo no trabalho, talvez porque ele pareça o único ponto de controle efetivo que temos. Afinal, como dizem, “o trabalho não vai acordar um dia e decidir que não te quer mais”. Absorvendo discursos como esse, acabamos caindo numa armadilha sutil, mas profunda.

Vivemos um tempo em que muitas mulheres se sentem perdidas na área sentimental — não por falta de parceiros, mas por excesso de relações sem profundidade. Relacionamentos líquidos, afetos ansiosos, vínculos frágeis. Entre idas e vindas, sobram promessas vazias e escassez de encontros verdadeiros.

O sociólogo Zygmunt Bauman chamou esse fenômeno contemporâneo de “amor líquido” — relações marcadas pela instabilidade, pelo medo do compromisso e pela dificuldade de sustentar profundidade. Vivemos em um tempo em que tudo precisa ser leve, rápido e facilmente substituível — inclusive o outro.

Assim, muitos vínculos se tornam descartáveis. E o medo da entrega cresce, porque amar de verdade exige vulnerabilidade, paciência e presença — tudo o que a lógica do imediatismo e do desempenho não sustenta.

Nessa dinâmica, muitas mulheres vivem entre dois medos: o de ficarem sozinhas e o de se perderem dentro da relação. Mas a verdade é que a dor mais profunda não é estar sem alguém, e sim não se sentir amada por quem se é.

A resposta não está em desistir do amor, mas em parar de buscá-lo como salvação.

O amor, quando vivido com verdade e sentido, é uma das experiências humanas mais transformadoras. Viktor Frankl, psiquiatra austríaco e criador da Logoterapia, dizia que o ser humano é movido por uma busca de sentido — e que o amor tem um papel essencial nessa jornada.

Mas, antes de buscá-lo no outro, talvez seja preciso olhar para dentro e se perguntar:

– Eu me enxergo com amor?

– Reconheço meu valor para além de ser escolhida por alguém?

– Estou buscando amor ou apenas tentando escapar da solidão?

É justamente por buscar fora aquilo que só pode ser construído dentro que tantas mulheres adoecem em suas relações. O amor verdadeiro não prende — liberta. Ele vê o outro como um fim em si mesmo, não como um preenchimento de um vazio.

Quando uma mulher se reconecta com seu valor, quando compreende que o amor mais profundo não a apaga, mas a revela, então nasce um novo espaço:

Um espaço para vínculos mais verdadeiros.

Um espaço para ser vista — primeiro por si mesma, depois por quem souber vê-la de verdade.

Um convite à reflexão

Aproveito para te fazer um convite íntimo, com carinho e sem pressa:

• O que você acredita que precisa mudar em si mesma para ser amada?

• Qual é o padrão que mais se repete nas suas relações afetivas?

• Você se sente vista, ouvida e compreendida na sua relação?

• Em que momentos você se abandona para manter o outro por perto?

• O quanto da sua paz depende do comportamento de outra pessoa?

• O que você busca no outro que talvez ainda não encontrou em si?

Priscila Vogt é psicóloga clínica especialista em Logoterapia. Natural de Curitiba/PR, atualmente reside em Florianópolis, é amante de praia, sol e natureza. Se apaixonou por ajudar mulheres a encontrarem seu lugar no mundo e resgatarem sua autoconfiança. Hoje atua no On Line, mas também tem consultório na Ilha da Magia. @psipriscillavogt

Os textos de colunistas não refletem, necessariamente, a opinião da Revista Propósito