Coluna
Pega o casaco

por Elis Amanda

Malabarismos entre maternidade, carreira profissional e identidade

O ano era 2018 e eu gestava minha primogênita quando ouvi de alguém: “depois que você é mãe, nunca mais será a mesma”. Na ocasião, senti um frio na barriga acompanhado de uma dualidade com aquela afirmativa, pois, ao mesmo tempo que me assustou, me desafiou a querer ser um tanto mais forte para a nova fase que estava por vir. Na época, eu trabalhava uma média de dez a doze horas por dia e vivia numa engrenagem incessável, abraçava diversas funções na Psicologia como a coordenação de curso, a docência e ainda o consultório. Me sentia cada dia mais plena e realizada profissionalmente. 

 

Alguns meses depois veio a alegria imensurável do nascimento da minha primeira filha e eu já senti que aquela frase de outrora começou a ancorar e fazer cada vez mais sentido. Definitivamente, eu não era mais a mesma, pois fui apresentada à flor e ao ferro da maternidade, a um amor arrebatador e delicado, e a uma face extremamente firme que nem eu sabia que possuía.

 

Aos poucos, percebi que fui me tornando cada dia mais uma mulher “polvo”, especialista na arte de equilibrar malabares nas diferentes funções: vida profissional, maternidade, gerenciamento do lar, casamento e o ser mulher. Perceba que a função pessoal, o “ser mulher” está na lista, claro, mas ela vem, propositalmente, no final; no entanto, por vezes ela veio por último de forma até inconsciente. Sem dúvidas, o momento da maternidade é indiscutivelmente especial e transformador na vida de uma mulher, porém ela é repleta de complexidades, emoções e desafios únicos, envolvendo uma ampla gama de responsabilidades e habilidades que requerem uma constante adaptação e aprendizado.

 

Diante de um ciclo tão importante, muitas mulheres acabam se encontrando em uma crise de identidade, pois se tem uma coisa que a maternidade coloca à prova é o quanto nos priorizamos, o quanto respeitamos o nosso “quem sou eu no mundo” e até mesmo nossas escolhas. Equilibrar o cuidado com os filhos e consigo parece ser uma tarefa muito irreal, em que diante das necessidades destes, tendemos naturalmente a negligenciar as nossas, até de forma inata, pois nasce uma mãe nascem os autossacrifícios cotidianos, tais como a privação de sono, o hábito de comer frio, ou banho adiado para o final da noite.

Entretanto, apesar disso, esse estado não pode ser naturalizado com tamanha facilidade. Afinal, ser mãe não deve implicar em abrir mão da nossa própria identidade, mas sim em um processo de autodescoberta e crescimento, que enriquece tanto a mulher quanto sua família. Penso que depois que se é mãe, toda mulher precisa perceber e se orgulhar da fênix que nos descobrimos ser. 

 

Nesta primeira coluna sobre o tema eu quero lembrar a você mulher e mãe que, quando nos permitimos valorizar a nossa própria individualidade refletimos um espaço de autorrespeito na maternidade, e em paralelo ensinamos aos nossos filhos sobre o amor mais belo que existe: o amor próprio.

Elis Amanda é doutora e mestre em Psicologia pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Amante dos momentos em família, viagens e gastronomia; é casada com um grande homem e mãe de dois. @elisamanda_psi

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