Coluna
Conexões sociais

por Arthur Arruda

Para além de uma celebração festiva: o 8 de março como símbolo de luta feminista

No dia 8 de março celebra-se o Dia Internacional da Mulher. Em nosso país, esta data muitas vezes é reduzida a uma mera celebração festiva, na qual, se convencionou presentear, as mulheres, com flores e bombons como uma forma de expressar carinho e admiração. No entanto, é essencial, para além desses gestos, não desvincularmos a referida data daquilo que lhe originou, para não corrermos o risco de reduzir a importância do movimento feminista e das lutas históricas das mulheres. 


Nesse sentido, é importante se atentar para o seu verdadeiro significado. Para Blay (2001) há no interior da nossa sociedade um apagamento da origem desse evento, referente ao fato de associarem, erroneamente, o 8 de março a algumas tragédias, a exemplo, do incêndio que ocorreu em 25 de março de 1911, na fábrica têxtil Triangle Shirtwaist Company, que levou 146 trabalhadores a perderem suas vidas. Para a autora citada, embora essa tragédia tenha sua devida importância para o movimento de trabalhadores nos EUA, foram as militantes socialistas, na figura de Clara Zetkin (1857 – 1933), teórica marxista e feminista alemã, dedicada a causa da igualdade de gênero e a conscientização do papel da mulher como trabalhadora e cidadã, que propuseram no II Congresso Internacional de Mulheres Socialistas, realizado em Copenhagen, em 1910, a criação de uma jornada de lutas das mulheres, entretanto, sem uma data estabelecida. 


Posteriormente, em 1975, a ONU a reconhece o 8 de março como o Dia Internacional da Mulher. Já em 1977, a Unesco reconhece a data associando-a a memória as greves e aos incêndios do início do século XX. Para Garcia e Abrahão e Sousa (2014) esse gesto da Unesco só alimenta um discurso que apaga as lutas das mulheres no decorrer de séculos. Diante dessa superficialidade que acaba desviando a data de seu propósito original e fundamental se faz necessário rememorar as diversas conquistas das mulheres e reforçar a luta contra as desigualdades de gênero através do reconhecimento das diversas lutas travadas ainda pelas mulheres. Chamamos, portanto, a reflexão sobre os desafios vivenciados pelas mulheres em diversos aspectos da vida: trabalho, política, educação e violência de gênero. Aspectos esses que são facilmente identificáveis nos diversos dados estampados nas manchetes dos jornais, redes sociais etc, sobre a desigualdade de gênero.


De acordo com dados de 2019, levantados pelo IBGE e TSE, as mulheres correspondem a mais da metade da população brasileira, 51,1%, mas ocupam menos cargos de chefias (37,4%) e recebem, em média, 77,7% dos rendimentos dos homens ocupando a mesma função. Além de sofrerem com violência, 19% das mulheres com 18 ou mais já foram vítimas de violência física, psicológica ou moral. E, embora, no último pleito o número de mulheres tenha crescido ainda se encontra muito aquém pra proporção populacional.


Esses dados refletem ainda uma sociedade que produz e reproduz uma divisão sexual do trabalho em que as mulheres continuam a ocupar postos de trabalho periféricos e secundários, enquanto, por outro lado, os homens permanecem ocupando as tarefas de maior prestígio e remuneração. Nesta visão, as disparidades de gênero se perpetuam através dos processos de transformações na organização do trabalho, à medida que a precarização afeta homens e mulheres de maneira diferenciada. Isto é, as modalidades de participação e as oportunidades de qualificação divergem significativamente entre gêneros, o que permite ao capital explorar estas desigualdades inerentes às relações de trabalho (NASCIMENTO, 2016).


Para a autora supracitada, a melhoria da condição das mulheres na sociedade depende da superação do atual sistema de organização de produção e reprodução social, que é baseado na acumulação de capital, na exploração de classe e em um sistema político e ideológico que promove a individualização, a pobreza e a exclusão da maioria da população das riquezas produzidas socialmente. Para isso, é necessário ir além de uma celebração, é preciso utilizarmos eventos como o 8 de março como oportunidades para fortalecer a luta por uma sociedade mais justa e igualitária.

Arthur Arruda é psicólogo pela UEPB tem interesse e experiência nos seguintes temas: psicologia clínica, social, social comunitária, saúde mental. É nômade digital, apaixonado por futebol e amante da MPB. @arthurmarcell_

Os textos de colunistas não refletem, necessariamente, a opinião da Revista Propósito