Coluna
Barba, cabelo e bigode

por Ronnedy Paiva

Masculinidade tóxica: assédio e abuso do poder em espaços de fé

Infelizmente, constantemente temos acesso a informações e relatos de mulheres e crianças que foram, de alguma maneira, assediadas dentro de igrejas ou templos religiosos por pessoas que possuem algum cargo de liderança ou espiritualidade. Esses assediadores, majoritariamente homens, aproveitam-se da vulnerabilidade de suas vítimas e de sua influência para cometer atos pecaminosos e criminosos, afastando-se da verdadeira prática espiritual e se deixando dominar pela “carne” — um termo comumente utilizado para referir-se à natureza humana caída, às inclinações pecaminosas e aos desejos que desviam o ser humano de uma vida alinhada com Deus. 


Vale ressaltar que assédios e abusos não são uma exclusividade das instituições religiosas. Relatos de situações semelhantes ocorrem em instituições de ensino, ambientes profissionais, espaços públicos (como ruas, shoppings e festas) e privados (como em casa e nas redes sociais), envolvendo tanto homens quanto mulheres, conhecidos e desconhecidos das vítimas. O assédio, muitas vezes, não se limita ao caráter sexual; pode manifestar-se também de formas morais, institucionais, virtuais e religiosas. O que chama a atenção, no entanto, é que, no âmbito religioso, essas práticas são frequentemente realizadas por indivíduos que pregam um ideal de comportamento (santo, perfeito), enquanto, em contrapartida, cometem ações que podem ser classificadas como depravadas ou caídas, especialmente com aqueles que depositam sua confiança, tempo, dinheiro e fé nessas instituições. 


Esse contraste entre discurso e prática revela uma hipocrisia que pode ter consequências devastadoras para as vítimas e para a própria instituição. Longe de querer encerrar a questão em um texto breve ou de trazer uma resposta concreta sobre os motivos que levam ao crime de assédio, seja ele de que caráter for, em instituições religiosas, é possível destacar alguns aspectos que a psicologia aponta para entender esse fenômeno. Primeiramente, o poder e o controle exercidos por homens em posições de liderança podem criar um ambiente propício para o abuso, especialmente quando normas culturais reforçam a ideia de dominação masculina.


Essa dinâmica é frequentemente alimentada pela falta de supervisão e responsabilização dos agressores. A falta de sensibilidade e a normalização de comportamentos inadequados podem fazer com que os agressores não reconheçam a gravidade de suas ações. Assim, quando comportamentos abusivos são minimizados ou ignorados, cria-se um ciclo vicioso que legitima o assédio, onde, em muitos casos, o assediador sente-se encorajado a cometer os atos criminosos, pois, caso seja denunciado, pode, de alguma maneira, sair impune de seu crime ou minimamente afetado. Outro fator que pode colaborar para que o assédio ocorra é a imaturidade. Essa imaturidade, muitas vezes, se manifesta em diversas áreas, incluindo a incapacidade de estabelecer limites saudáveis, em compreender as consequências de ações inadequadas, em uma compreensão distorcida das dinâmicas de poder e em uma dificuldade em lidar com os desejos e impulsos de maneira responsável. 


Associado a vulnerabilidade da vítima, o assediador se aproveita dessa condição e comete seu crime. Existem tantos outros pontos que poderiam ser destacados nesse texto para tentar explicar o comportamento masculino envolvendo casos de assédio, porém não é possível encerrar o assunto de forma fácil. Contudo, vale trazer a reflexão sobre a importância de haver uma supervisão e uma punição para aqueles que cometem crimes em instituições religiosas ou fora delas. A conscientização, a educação e a criação de um ambiente seguro e de apoio são passos essenciais para combater essa problemática, garantindo que instituições que deveriam ser refúgios de espiritualidade e respeito não se tornem espaços de abuso e desconfiança.

Ronnedy Paiva é psicólogo, especialista em Psicologia Existencial, Humanista e Fenomenológica e Pós-graduando em Logoterapia e Análise Existencial. Natural de Londrina-PR, gosta de futebol, livros, estudos, conversas e comida boa! Escreve sobre existência e masculinidade, acreditando que o diálogo pode transformar as relações existentes consigo, com o outro e com o mundo. @ronnedypaiva

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